domingo, agosto 26

Homenagem ao escritor e ensaísta Eduardo Prado Coelho (1944-2007)


Claude Monet «Femme à l'ombrelle tournée vers la gauche», 1886


‹‹FEMME À L’OMBRELLE››

A Revolução nasce do chapéu de chuva de monet,
não por acaso, mas porque estava um dia de chuva. Ou antes,
as nuvens que cobrem a parte superior dos dois lados
da tela tornam inevitável e evidente a aparição do chapéu de chuva
nas mãos da mulher. É que algures, por detrás daquilo que se vê
e é claro, uma sombra próxima, e de cuja transparência se faz reflexo
o poema, concentra as diversas tensões convergentes na proximidade
do temporal. Por que razão, perguntar-se-ia a propósito, aquela mulher
está ali, à espera da chuva, batida pelos ventos e rasgada pelos
arbustos? Também a impressão, que tenho na minha frente, pouco
transmite da cor original. Só um brilho, sobretudo quando apenas entreabro
a janela, não deixando entrar um excesso de luz, se solta e bate
na parede, sobre o tampo da secretária em que escrevo, e momentaneamente
reproduz aquela figura solitária − agora que este adjectivo,
inesperado, aqui surge logicamente solicitado pelo poema.
Por fim, a própria parede se identifica com o horizonte:
para onde me dirijo, de certo modo sem a esperança
num próximo regresso.

(Nuno Júdice)

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