Metafísica
(oil on canvas)
- Private Collection -
*
*
Metafísica
Foi em Taipé.
Se bem me lembro, a 3 de Outubro.
Nas árvores o sol crescia devagar.
Entrámos num dos templos da cidade
e era quando os crentes fazem as suas oferendas.
Uma monja revestida de amarelo oficiava
e o fumo dos pivetes enlaçava-se
na música dos sinos e dos címbalos.
Nunca vi em parte nenhuma uma monja tão bela
e os seus gestos oficiando eram belos como ela.
Na música transportava-me não ao céu
mas aos braços da monja erguidos
maduros e redondos para o amor.
Sobre um estrado recebendo as bênçãos
vi comidas que só os chinas sabem oferecer a deuses
e que pelos deuses abençoadas eles retomam, e comem.
Mas sobretudo vi um cacho de bananas
cor de ouro, enormes, sardentas.
Quando saí não pude deixar de comprar bananas,
que logo amorosamente devorei.
E por isso ainda hoje penso na monja de amarelo,
nos gestos que fazia oficiando.
Nunca mais voltarei a Taipé
nem comerei bananas como aquelas.
Que a vida é assim, amigos:
recordar, por exemplo, a beleza de uma monja
e um cacho de bananas
e contentarmo-nos depois com o que temos
onde não temos nada disso.
(Pedro da Silveira) *
in «Corografias», 1985
Foi em Taipé.
Se bem me lembro, a 3 de Outubro.
Nas árvores o sol crescia devagar.
Entrámos num dos templos da cidade
e era quando os crentes fazem as suas oferendas.
Uma monja revestida de amarelo oficiava
e o fumo dos pivetes enlaçava-se
na música dos sinos e dos címbalos.
Nunca vi em parte nenhuma uma monja tão bela
e os seus gestos oficiando eram belos como ela.
Na música transportava-me não ao céu
mas aos braços da monja erguidos
maduros e redondos para o amor.
Sobre um estrado recebendo as bênçãos
vi comidas que só os chinas sabem oferecer a deuses
e que pelos deuses abençoadas eles retomam, e comem.
Mas sobretudo vi um cacho de bananas
cor de ouro, enormes, sardentas.
Quando saí não pude deixar de comprar bananas,
que logo amorosamente devorei.
E por isso ainda hoje penso na monja de amarelo,
nos gestos que fazia oficiando.
Nunca mais voltarei a Taipé
nem comerei bananas como aquelas.
Que a vida é assim, amigos:
recordar, por exemplo, a beleza de uma monja
e um cacho de bananas
e contentarmo-nos depois com o que temos
onde não temos nada disso.
(Pedro da Silveira) *
in «Corografias», 1985
Etiquetas: Lucio Fontana (1899-1968) pintor e escultor italiano nascido na Argentina, Pedro da Silveira (1922-2003) Flores/Açores
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