domingo, agosto 24

DEITADO NA AREIA


Eric Beaudelaire, Imagined States series «Tide» 2005
(c-print, diasec, oak)
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DEITADO NA AREIA
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Horas e horas deitado na areia caído
Na praia
Ou por algum braço arremasado. Pouco a pouco
Deixei de sentir os grãos finíssimos
Colarem-se-me à pele. Deixei de ver
O céu que meus olhos olhavam.
As primeiras ondas que me tocaram os pés
Ainda as senti − bocas minúsculas
Bebendo meu sangue silencioso.
Mas as segundas já não eram frias nem quentes já não
Eram
Suaves nem ríspidas já não possuíam
Lábios nem dentes. E nada sei
Das seguintes como nada já sabia
Da areia nem do sal nem dos bichos que passavam
Por cima do meu corpo depois de terem passado
Pelo corpo da areia.
Durante algum tempo durante a rigorosa eternidade
De um momento
Foi como se eu fosse também areia mar e sol
E talvez eu tenha sido
Areia sol e mar. O resto
É vento.

(Casimiro de Brito)

poema lido no VI Congresso Mundial de Poesia,
Ilhas Canárias, 1982
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2 Comentários:

Blogger hfm disse...

Sempre cantantemente bela a poesia de Casimiro de Brito.

30 de agosto de 2008 às 10:15  
Blogger Mar Arável disse...

Posso oferecer-lhe um poema?

4 de setembro de 2008 às 22:28  

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