Amarelo quebrado
John Stezaker «Third Person II» 1988-1990, collage
*
Amarelo quebrado
Amarelo quebrado
*
As casas ganham um ar mais mortal
na tristeza depois de não ter havido coito.
Vão depressa as nuvens, tão depressa,
levam pombos e telhados agudos com ardósia quebram
em radiações de treva na água aprisionada.
*
Já tínhamos falado de tudo na véspera,
do adiamento, da sufocação,
mas senti que não seria assim.
Com a garganta ao contrário da Holanda,
seca, incapaz de falar.
*
Vi os gráficos do sangue empresarial.
Na floração das vendas, o risco suspendia
câmbios de gasolina sobre mim.
Ao som do telefax, um visor de números
era agora o teu rosto.
*
Por cima do casaco hesitavam as mãos
de novo perdidas no medo de prender-se
ao metal tecido de milagre da saliva.
Eram mãos que não sabiam pousar.
*
A experiência agora é esta: chamar desamor
à emoção que não entende o que deseja,
confunde os sentimentos numa aridez tão pesada
que nem eu percebo como deixa voar um avião
por este sem fim de céu que traz o fim.
*
Mas foi horas antes que findou.
Ia a noite avançando, escurecia o hotel
e as mãos ficaram presas. Tanto tempo,
tanto tempo nenhum.
(Joaquim Manuel Magalhães)
in «As Escadas não têm Degraus», Livros Cotovia, 1990
As casas ganham um ar mais mortal
na tristeza depois de não ter havido coito.
Vão depressa as nuvens, tão depressa,
levam pombos e telhados agudos com ardósia quebram
em radiações de treva na água aprisionada.
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Já tínhamos falado de tudo na véspera,
do adiamento, da sufocação,
mas senti que não seria assim.
Com a garganta ao contrário da Holanda,
seca, incapaz de falar.
*
Vi os gráficos do sangue empresarial.
Na floração das vendas, o risco suspendia
câmbios de gasolina sobre mim.
Ao som do telefax, um visor de números
era agora o teu rosto.
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Por cima do casaco hesitavam as mãos
de novo perdidas no medo de prender-se
ao metal tecido de milagre da saliva.
Eram mãos que não sabiam pousar.
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A experiência agora é esta: chamar desamor
à emoção que não entende o que deseja,
confunde os sentimentos numa aridez tão pesada
que nem eu percebo como deixa voar um avião
por este sem fim de céu que traz o fim.
*
Mas foi horas antes que findou.
Ia a noite avançando, escurecia o hotel
e as mãos ficaram presas. Tanto tempo,
tanto tempo nenhum.
(Joaquim Manuel Magalhães)
in «As Escadas não têm Degraus», Livros Cotovia, 1990
Etiquetas: Joaquim Manuel Magalhães (1945), John Stezaker (1949-) artista plástico inglês
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